A censura na vida de Glauber Rocha

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Glauber de Andrade Rocha viveu em constante litígio com a tesoura dos profissionais da Censura, porém antes mesmo de seguir a carreira cinematográfica sofrera a intervenção do referido órgão quando ainda adolescente encenava poemas brasileiros junto ao “Jogralescas Teatralização Poética”, grupo que fundou com sua irmã Anecy e outros conterrâneos, como os poetas Fernando da Rocha Perez e Paulo Gil Soares, além do artista plástico Calasans Neto.
Em entrevista concedida na década de 70 ao crítico francês Michel Ciment, para a revista Positif e publicada no livro Revolução do Cinema Novo, Glauber comenta sobre a primeira interferência de muitas que aconteceriam em sua vida: “No começo, nós queríamos encenar tragédias gregas, mas achamos difícil e também pouco adequado às circunstâncias. Então encenamos poemas. Era época em que o Brasil vivia uma loucura poética. Fizemos espetáculos dialogando e dramatizando poemas. Mas as representações foram suspensas pela censura”.
Começou a realizar curtas-metragens e sua primeira obra intitulada “Pátio” é filmada em 1957, utilizando sobras de material de “Redenção”, de Roberto Pires (primeiro longa-metragem baiano). A partir desse momento Glauber não parou mais, afinal sua máxima era “Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”.
Em 1960 começa a trocar correspondências com o cubano Alfredo Guevara e também a trabalhar na produção executiva de “Barravento”, dirigido por Luiz Paulino dos Santos. Após conturbações, Glauber assume a direção do filme e refaz o roteiro, finalizando as filmagens em 1961 no Rio de Janeiro. Em 1962 Glauber realizou sua primeira viagem à Europa e “Barravento” recebeu o Prêmio Opera Prima no Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary, na Tchecoslováquia.
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Cena do filme Barravento (1962)
Enquanto isso, no Brasil, em 1963 o filme começa a apresentar problemas com a Censura por “conter mensagens subversivas de profundidade de maneira subliminar tão acintosa que chega a poder ser considerada direta”, no entanto Barravento consegue a liberação para maiores de 18 anos, além dos certificados de boa qualidade e livre para exportação – somente em 1980 um corte foi indicado no segundo rolo do filme.
No dia 18 de junho de 1963, Glauber inicia as filmagens de “Deus e o Diabo na Terra do Sol” no sertão da Bahia, concluídas em 2 de setembro. Em 1964, após a instauração do regime militar, o filme não enfrentou grandes problemas com a Censura, apesar de algumas desconfianças e sugestões de que a sua exibição não fosse liberada em cabines estrangeiras para não ridicularizar o país, por mostrar em demasia a pobreza brasileira. “Deus e o Diabo na Terra do Sol” é escolhido pelo Itamaraty para representar o Brasil no Festival de Cannes, junto com “Vidas Secas”, de Nelson Pereira dos Santos, também cinemanovista. Era a consolidação do Cinema Novo e da carreira de Glauber Rocha.
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Cena do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964)
Simultaneamente com a ascensão de Glauber, crescia a atenção que lhe era dada pela Censura Federal, inclusive sendo alvo constante de estudo de um dos consultores técnicos mais recorridos, Waldemar de Souza.
Em novembro de 1965, Glauber foi preso num protesto contra o regime militar em frente ao Hotel Glória, no Rio de Janeiro, durante reunião da OEA (Organização dos Estados Americanos). São presos com Glauber: Joaquim Pedro de Andrade, Mário Carneiro, Flávio Rangel, Antonio Callado, Carlos Heitor Cony, Jaime Rodrigues e Márcio Moreira Alves. Os “Oito da Glória” receberam cobertura ampla da imprensa solidária aos movimentos contestatórios, a prisão foi registrada por correspondentes estrangeiros e ganhou repercussão internacional, por fim um telegrama de protesto assinado por Truffaut, Godard, Alain Resnais, Joris Ivens e Abel Gance é enviado ao presidente Castelo Branco, que apressa a saída da prisão.
Glauber e suas obras já não eram vistos com bons olhos pela Censura, antes mesmo da militarização do órgão em 1968, como pôde se notar no episódio que envolveu a interdição do seu terceiro longa-metragem “Terra em Transe”, um ano antes do decreto AI-5.
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Cartaz do filme Terra em Transe (1967)

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